Cotonicultura do Brasil fez da diversificação o caminho para a proteção sustentável de cultivos
Quando um consumidor opta por uma roupa de algodão, ele mostra que, além de muito estilo, faz escolhas que são mais “gentis” para o planeta. O algodão é natural, biodegradável, reciclável, e não contamina os rios e mares com micropartículas nocivas ao meio ambiente a cada vez que a peça é lavada. E quando o algodão é produzido no Brasil, além de tudo isso, quem o compra pode ter certeza de que ele também é sustentável, porque foi produzido dentro de padrões criteriosos e internacionalmente reconhecidos de boas práticas ambientais, sociais e econômicas.
Atualmente, 77% das lavouras brasileiras são chanceladas pelo Programa Algodão Brasileiro Responsável (ABR) e pela Better Cotton Initiative (BCI). O ABR, certificação da Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa), e a BCI, organização suíça referência em licenciamento de fibra sustentável, operam no Brasil em benchmark desde 2013. Essa atuação conjunta por uma produção responsável de algodão é um caso de sucesso que tem contribuído para impulsionar a imagem da fibra brasileira no mundo e conquistar a preferência das indústrias, sempre atentas às demandas de consumidores cada vez mais conscientes.
Suando a camiseta
Para chegar ao status de fornecedor de algodão sustentável, o produtor tem de ralar muito para seguir protocolos e cumprir um extenso check list. O Brasil é campeão nesse quesito. Segundo a BCI, em seu relatório lançando em junho deste ano, o Brasil detém a maior parte do algodão chancelado pela entidade. Em 2019, a participação nacional no montante global foi de 36%. Números, protocolos, certificações e licenciamentos já seriam motivo de sobra para o país se orgulhar desse posto, mas se a gente levar em consideração o desafio que é produzir algodão no Brasil, essa vitória fica ainda mais saborosa.
Primeiro, é preciso esquecer aquele negócio de que, aqui, em se plantando tudo dá. Dá, sim, muito trabalho, porque o mesmo clima, o mesmo solo e as condições que fazem as plantas crescerem rapidinho, também são tudo de bom para pragas, doenças e ervas daninhas, os chamados inimigos das lavouras. Para complicar, como aqui não temo invernos com neve ou clima de deserto, esses bichinhos e plantas não desejáveis têm vida boa o ano inteiro. Por isso, é preciso investir em proteção de cultivos.
De acordo com o consultor agronômico Celito Breda, que também é produtor rural na Bahia e supervisor do programa fitossanitário da Associação Baiana dos Produtores de Algodão (Abapa), manter esses “carinhas” fora das lavouras custa caro para o produtor. “Somando-se o valor dos defensivos e o dos royalties, pode-se gastar em torno de 30% a 40% do custo total médio de produção, por hectare, somente com proteção de cultivos. No caso do algodão, esse custo pode chegar a US$ 1mil dólares por hectare”, diz.
Não bastasse isso, a cada safra, as pragas, doenças e ervas daninhas ficam mais resistentes, e, da mesma forma como acontece com os antibióticos que a gente toma quando está doente, com o passar do tempo, eles tendem a deixar de fazer efeito. Então, novas moléculas precisam entrar em circulação – o que, no Brasil, pode levar até dez anos para acontecer – ou uma quantidade maior de produto precisará ser utilizada, o que não é bom nem para o meio ambiente, nem para as pessoas, nem para o bolso do produtor.
Junto e misturado
O jeito inteligente que o cotonicultor brasileiro encontrou para proteger suas lavouras foi o Manejo Integrado de Pragas (MIP). Significa um arsenal de tecnologias químicas, biológicas e mecânicas, além de outras práticas fitossanitárias utilizadas estrategicamente no combate. Por exemplo, o pior inimigo das lavouras de algodão é um besouro, o bicudo-do-algodoeiro. Para combatê-lo, além do controle com inseticida, é preciso uma série de procedimentos, como erradicar todas as plantas de algodão do campo após a colheita, para cortar o fornecimento de comida para o bicudo na entressafra.
Os produtores de algodão no Brasil, através da Abrapa e em convênio com a Embrapa, IMAmt e universidades nacionais e internacionais, estão pesquisando e buscando desenvolver um algodão geneticamente resistente ao bicudo. Se conseguirem, serão pioneiros no mundo e muito menos químicos precisarão ser usados no combate.
Segurança atestada
Apesar das vantagens de reduzir o uso de defensivos químicos, proporcionada pelo MIP, é importante dizer que os produtos fitossanitários em uso no Brasil são seguros. Eles são desenvolvidos por empresas que empregam ciência e tecnologia de ponta. Para que um novo produto chegue aos produtores rurais, é preciso muita pesquisa e avaliações rigorosas de qualidade. São necessários cerca de 12 anos de estudos e investimento aproximado de US$ 250 milhões para que uma nova substância possa ser utilizada.
Antes de serem liberados para os agricultores, os produtos são avaliados e registrados junto aos órgãos reguladores responsáveis pelas áreas de agricultura (Mapa), saúde (Anvisa) e meio ambiente (Ibama). Os procedimentos regulatórios adotados pelo Brasil fizeram com que, nos últimos 40 anos, as doses dos produtos fitossanitários fossem reduzidas em quase 90% e a toxicidade aguda, em mais de 160 vezes.
“Pragas” do bem
Nos últimos anos, o emprego dos famosos “inimigos naturais” de pragas e doenças tem crescido bastante. Só no Brasil, em 2019, o incremento no uso dos chamados defensivos biológicos foi de 15% e, no mundo, de 7%. Até 2014, existiam 60 produtos registrados no país e, em 2019, esse número passou de 260. Atualmente, o controle biológico no país já está presente em 23 milhões de hectares de lavouras. Os defensivos biológicos são divididos em “microbiológicos” (fungos, vírus e bactérias) e macrobiológicos (insetos, etc). Eles são cultivados/produzidos nas biofábricas, nas próprias fazendas ou em laboratórios, para serem utilizados nas lavouras, para o controle fitossanitário.